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Retomadas indígenas

Quarta-feira, 28 de Abril de 2021

 
     

Cacique Xokleng: economia com a natureza e re-existências possíveis

  

Terça Ecológica de abril de 2021 evidencia a situação do território indígena ou Floresta Nacional, em São Francisco de Paula (RS), que aguarda o reconhecimento e a demarcação desde os anos 1990, mas foi incluído no programa de desestatização do governo federal

  

Reprodução de imagem do evento virtual    
Cacique Woie Patté Xokleng


Por Eliege Fante - especial para a EcoAgência

O jornalismo ambiental busca ampliar as nossas visões de mundo reverberando outras formas de re-existências possíveis. Por isso, a Terça Ecológica deste mês de abril de 2021, ouviu o cacique Woie Patté Xokleng da Retomada Xokleng Konglui, em São Francisco de Paula. O cacique Mbyá Guarani André Benites, da Retomada em Maquiné, não pôde participar ao vivo devido à falta de conexão durante a viagem em que se encontrava. Mas, o Núcleo de Ecojornalistas mantém aberto o convite para ele, assim como outros caciques e de outras Retomadas, participar dos nossos eventos quando for possível.  

As Retomadas indígenas acontecem em todo o Brasil e constituem ações muito corajosas para buscar a sobrevivência diante da hostilidade dos governos e dos setores econômicos dominantes. O retorno do povo Xokleng ao solo ancestral, conhecido como Floresta Nacional de São Francisco de Paula, ocorreu em dezembro de 2020. Mas, desde o dia primeiro deste ano, estão acampados do lado de fora da área, na RS 484, devido à reintegração de posse ter sido autorizada, pela justiça, na noite de Natal. A seguir, destacamos alguns aspectos tratados pelo cacique na live que pode ser assistida aqui.

 

Contexto 

A Retomada em São Francisco de Paula, conforme o cacique Woie Patté Xokleng contextualizou, ocorreu a partir de dois aspectos principais: primeiro, pela vontade de retornar ter se mantido desde a expulsão, há cerca de 100 anos, quando foram vítimas de violências e extermínios, causadas por pessoas que se apropriaram das terras. “Só saímos por garantia de vida e contra a nossa vontade. Muitos não conseguiram sair e estão enterrados ali no nosso território, outros foram para Santa Catarina e outros, ainda, vivem em aldeias Kaingang.” Explicou que desde os anos 1990 estão mobilizados para demarcar a área, porém sem sucesso. Nesses anos que se passaram, a Funai não retornou aos Xokleng, segundo o cacique Woie, o processo de reconhecimento e delimitação da área, e nem a formação de um grupo de trabalho para realizar os estudos, como antropológico, para provar a ancestralidade indígena no lugar.  

A ameaça de privatização da Floresta Nacional em São Francisco de Paula, foi o segundo aspecto retratado pelo cacique Woie Xokleng. O desmonte das políticas ambientais em curso no Brasil, acelerado durante o mandato do governo Bolsonaro, constitui-se também de um programa de desestatização, em acordo com a ordem neoliberal. No primeiro semestre de 2020, o governo federal anunciou a inclusão, nesse programa, das duas florestas nacionais no Rio Grande do Sul, em São Francisco de Paula e em Canela, com o objetivo de realizar parcerias com a iniciativa privada. Duas audiências públicas foram realizadas no mesmo ano, representando um passo a mais em direção à privatização desses territórios indígenas. Em Canela, o povo Kaingang também está mobilizado em Retomada. 

 

Diálogo 

“A Convenção 169 da OIT nos garante o direito de sermos ouvidos porque somos parte interessada neste território. Além disso, em 2020, o plano de manejo da área também foi feito sem termos sido consultados. Nunca tivemos liberdade de entrar no nosso território, sendo que as nossas casas subterrâneas mostram a nossa origem neste lugar. A nossa autonomia e presença são fundamentais no Rio Grande do Sul, porque nossa luta é legítima e, negar isso, é uma forma de nos exterminar, assim como foi feito no passado. Vamos permanecer onde nosso povo sobreviveu por muito tempo, é nosso direito morar neste território.” O Cacique Woie ainda ressaltou a abertura ao diálogo para esclarecer quaisquer dúvidas que possam existir sobre as origens do território Xokleng em São Francisco de Paula. “A luta do povo indígena é pelo bem de todos, da sociedade, da humanidade. Somos guardiões das florestas como a ONU reconheceu. Mas, há muita desinformação nas cidades, em São Francisco de Paula também, onde nos veem como invasores. É fundamental que a população venha nos ouvir, entender a nossa luta e conhecer a própria história do município.”  

 

Economia com a natureza 

“Estamos no meio da sociedade não-indígena, não porque perdemos nossa cultura, sim porque estamos tentando sobreviver diante de todo o impacto socioeconômico e ambiental,” disse a respeito das alterações percebidas nos territórios indígenas e nos demais, atingidos por plantações de soja, hidrelétricas, barragens de contenção de cheias, etc. As mudanças de usos dos solos, através do desmatamento ou supressão de vegetação nativa (no caso dos campos) para implantar monoculturas de commodities, são a principal causa de destruição da biodiversidade em todos os biomas com a consequência do desequilíbrio dos ecossistemas e, a emergência da mudança climática devido às emissões dos gases de efeito estufa que essas atividades implicam. 

“Quase não temos mais floresta Mata Atlântica e, para nós, a falta da natureza tem um impacto muito maior, porque estamos sem os nossos alimentos tradicionais, sem a medicina tradicional, está difícil manter o nosso jeito próprio de viver. As nossas plantações são orgânicas e de agroflorestas, porque nós plantamos junto com a natureza, nós vivemos junto com ela há muito tempo, não vivemos em separado, ela nos complementa e nós complementamos ela.” 

 

Re-existências

Os ensinamentos ancestrais e o atendimento a um chamado espiritual, sustentam a Retomada Xokleng Konglui. O apoio de não-indígenas contribui tanto para o reconhecimento e a demarcação da área, como do Ministério Público, Comin, Cimi e Defensoria Pública. E, também, para a subsistência das famílias acampadas, já que, segundo afirmou o cacique, nenhum auxílio veio do governo federal ou Funai. As informações relacionadas ao atendimento das necessidades dos Xokleng em São Francisco de Paula, podem ser acessadas nas páginas de internet no Facebook e no Instagram

As Terças Ecológicas são eventos ininterruptos desde 1994, e na maior parte desse tempo, foram mensais. Desde a pandemia da covid-19, o NEJ adaptou o evento ao formato virtual, através da página da EcoAgência no Facebook. Esses debates e palestras visam aproximar o público em geral às pessoas ativas na área ambiental, sejam técnicos, especialistas, ativistas, representantes de comunidades, entre outros. Esta Terça Ecológica teve a mediação da diretora de Relações Institucionais do Núcleo de Ecojornalistas do Rio Grande do Sul, Eliege Fante, e a técnica com a tesoureira do Núcleo, Débora Gallas. 

EcoAgência

  
  
  
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