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Dia do Bioma Pampa

Quinta-feira, 18 de Dezembro de 2014

 
     

Inicia a pressão sobre o Governo gaúcho para regulamentar a Lei 12.651/2012

  

O RS é o Estado mais atrasado do país no registro de propriedades no Cadastro Ambiental Rural (CAR). Enquanto isso, áreas de campo nativo vão sendo convertidas, sem licenciamento, em lavouras de soja

  

Rede Campos Sulinos    


Por Eliege Fante - especial para a EcoAgência

As entidades ambientalistas que comemoraram ontem o Dia do Bioma Pampa, 17 de dezembro, em Porto Alegre, durante evento público com a presença de pesquisadores acadêmicos e de técnicos da Secretaria Estadual de Meio Ambiente (Sema), decidiram não deixar “passar em branco” a data, face ao grave problema da perda de biodiversidade dos campos nativos. O compromisso assumido foi de pressionar a Sema e o Governador Tarso Genro a assinar a Minuta de Decreto elaborada pela Secretaria para regulamentar a aplicação da Lei 12.651/2012, de proteção da vegetação nativa, e efetivar o Cadastro Ambiental Rural (CAR).

A informação divulgada ontem é de que a Minuta de Decreto CAR e Vegetação do RS (Processo Administrativo 14569-05.00/14-5), que foi desenvolvida pela Divisão de Licenciamento Florestal (Debio/Sema), já cumpriu o percurso dentro da Secretaria mas, ao contrário de ter sido encaminhada ao Secretário Néio Pereira e, posteriormente, ao Governador, retornou ao Gabinete do Departamento de Biodiversidade (Debio, antigo Defap). O trabalho iniciado há quatro meses reuniu informações técnicas com o apoio de pesquisadores da Fundação Zoobotânica (FZB), do Centro de Ecologia e do Instituto de Botânica da UFRGS, do MP-RS, da Fepam, entre outros. O objetivo da Minuta de Decreto é “garantir o bom andamento do Cadastro Ambiental Rural no RS, como promissora ferramenta de gestão ambiental que entendemos possa ser, e sobretudo, assegurar que a vegetação nativa do RS possa ser devidamente protegida pelos instrumentos legais presentes na Lei 12.651/2012”. 

As resistências à implantação do CAR no RS, em especial no Bioma Pampa, têm origem nas entidades representativas do agronegócio que defendem que áreas de campo nativo com produção pecuária sejam consideradas áreas consolidadas e, por isso, têm orientado os produtores rurais a não preencher o Cadastro. A finalidade seria facilitar a supressão de vegetação nativa para a conversão em agricultura. Informações recentes revelam que pouco mais de 500 cadastros foram enviados à Sema em um total de 470 mil propriedades rurais no Estado, 30% delas situadas no Bioma Pampa. O prazo de entrega do CAR se encerra em maio de 2015. 

A Minuta de Decreto, para a qual há a expectativa dos participantes no evento comemorativo ao Dia do Bioma Pampa, de que seja assinado pelo Governador Tarso Genro, esclarece conceitos importantes para o preenchimento de informações no Cadastro Ambiental Rural, como por exemplo, a abrangência da área rural consolidada e dos remanescentes de vegetação nativa, a necessidade de autorização prévia do Debio/Sema para a supressão da vegetação nativa campestre, seja no Pampa ou na Mata Atlântica, e também define a pecuária extensiva como prática passível de ser conduzida nos campos dentro das áreas delimitadas como reserva legal, entre outros aspectos.

O professor da UFRGS e coordenador dos projetos de pesquisa da Rede Campos Sulinos, Valério De Patta Pillar, afirmou que a minuta de Decreto esclarece questões que são do interesse do setor produtivo sem abdicar da conservação dos campos. “Sem esta regulamentação, o sistema todo não avança e a fiscalização fica fragilizada,” afirmou. Ele acredita que falta a compreensão de que os campos com atividade pecuária são remanescentes de vegetação nativa. Ou seja, de acordo com a Lei 12.651/12, o artigo 26, estabelece que para converter uma área de campo nativo em lavoura de soja, por exemplo, é necessária uma autorização prévia da Sema, que irá avaliar a oportunidade da demanda.

O biólogo Eduardo Vélez, pesquisador da Rede Campos Sulinos, considera uma vantagem dos produtores rurais pampianos, em relação àqueles situados em outros biomas, o fato de poderem praticar a pecuária sustentável nas áreas de campo nativo delimitadas como reserva legal. “O controle da conversão das áreas de campo nativo situadas fora de APP’s e de Reservas Legais, por parte da Sema, baseado em critérios científicos, é essencial pois em algumas regiões os campos já foram quase que totalmente dizimados e, nestes casos, o interesse ambiental e social deve ser equilibrado com o interesse privado, sob pena das perdas para a biodiversidade serem irreparáveis.”

A engenheira florestal Sílvia Pagel, técnica da Fepam e integrante do MOGDEMA, lembrou que o número mais recente sobre o estado de conservação do Pampa data de 2008: 36% do bioma com remanescentes de vegetação nativa. Adiantou que deverá ser realizado o zoneamento ecológico econômico para todo RS em 2015 e explicou que será um instrumento importante assim como o Zoneamento Ambiental para a Silvicultura (ZAS), que orienta por unidades de paisagem o percentual máximo a ser ocupado por essa atividade produtiva. 

Biodiversidade

Vélez apresentou imagens das diferentes paisagens pampianas gaúchas, localizadas na metade sul do RS e na parte sul das Missões. Contrariando o senso comum sobre os campos nativos, apresentou a enorme biodiversidade que vem sendo catalogada, os diferentes tipos de campos já reconhecidos (campos com barba de bode, campos com espinilho, campos de areais, campos de solo raso, campos graminosos, dois tipos de campos mistos, campos arbustivos, campos litorâneos e campos de altitude). Explicou que estes ecossistemas possuem uma imensa diversidade de espécies de flora e fauna e constituem verdadeiras “paisagens culturais sustentáveis”, conforme definiu, devido a combinação entre a presença de vegetação nativa que é o hábitat da fauna nativa e ao fato de que as áreas são produtivas mediante a prática da pecuária que gera empregos e renda.

Citou ainda dados inéditos da pesquisadora da Rede Campos Sulinos, Dra. Ilsi Boldrini, de que há mais de duas mil espécies vegetais no Pampa, com cerca de 350 espécies endêmicas. Comentou também que em um único metro quadrado de campo nativo coexistem dezenas de espécies. Esta informação foi complementada por um estudante orientado pela Dra. Ilsi, que recentemente presenciou um novo recorde: 57 espécies em apenas um metro quadrado de campo. “Há quem não dê importância, mas a biodiversidade está aí. Evitar a supressão da vegetação nativa no Pampa é tão importante quanto na Amazônia,” disse.

Além da agricultura, o uso excessivo de  agrotóxicos, as invasões biológicas principalmente pelo capim annoni e, uma pecuária com excesso de carga animal estão entre as principais ameaças à conservação dos campos do Pampa. Dentre os desafios para a conservação destes ecossistemas, destacou a promoção da pecuária sustentável dentre outras atividades como o turismo rural e a criação de parques e reservas biológicas cuja meta para cada bioma é de 10%, mas o Pampa tem apenas 3,5%.

Lutzenberger

A geógrafa e jornalista, Claudia Dreier, da Fundação Gaia, apresentou o artigo “Prefácio para ‘Índices de lotação pecuária para o Rio Grande do Sul’” de José Lutzenberger, de 25 de junho de 1997, o qual evidencia o pensamento de um dos pioneiros do ambientalismo brasileiro e que ontem teria completado 88 anos. Ela substituiu o professor da UFRGS, Carlos Nabinger, que não pode participar por motivo de doença.

Conforme a sua apresentação, Lutz defendia a pecuária com manejo sustentável por proporcionar a qualidade diferenciada da carne proveniente do Pampa: “[...] os modernos esquemas de ‘produção’ com animais confinados, que mais merecem o nome de ‘campos de concentração’ de animais, nada produzem, apenas transformam, mas com grande perda. Alimentar gado, galinhas e porcos com grãos é dar-lhes alimento subtraído ao consumo humano, é agravar o problema da fome”.

Em outro trecho, Lutz afirma que “[...] o fazendeiro do Pampa já é e pode tornar-se ainda mais preservador de paisagens, de ecossistemas e de diversidade biológica e cultural. A linda cultura gaúcha também merece proteção, não podemos permitir que desapareça. À medida em que ele protege sua paisagem, a fauna e a flora, o fazendeiro merece reconhecimento oficial [...]”.  O artigo pode ser lido integralmente em Fundação Gaia.

Documentário

O historiador Tiago Rodrigues, integrante do Coletivo de Comunicação Catarse abordou a produção do documentário de 53min “Carijo”. Os municípios gaúchos que receberam a equipe de filmagem foram Panambi e São Miguel das Missões, onde os ervais e a pecuária que eram importantes fontes de renda acabaram substituídas pela sojicultura. “Carijo” mostra um modo de vida baseado na produção familiar coletiva, que envolve um conhecimento ancestral e demanda um trabalho criativo e pesado ao mesmo tempo,” disse.

Junto do documentário foram produzidos também dois materiais: o primeiro, uma cartilha que mostra a montagem do carijo, a estrutura de secagem através da qual se produz a erva-mate, ingrediente único do chimarrão, a bebida símbolo do RS. O segundo, é um livro de Moisés da Luz, biólogo que foi o coordenador técnico da produção do documentário.  Em “Carijo: saber cultural do RS, símbolo da resistência e conhecimento indígena e camponês na fabricação de erva-mate”, o autor mostra que a biodiversidade ajuda as populações a viverem no campo, contrariando as “visões que pregam a diminuição das áreas de conservação e o aumento das áreas de monocultivo”, seja soja, trigo, milho ou eucalipto. 

A realização da mesa redonda "Um olhar sobre o horizonte" em comemoração ao Dia do Bioma Pampa, foi uma realização do Movimento Gaúcho em Defesa do Meio Ambiente (Mogdema), da Agapan, do Ingá, do NEJ-RS e da Fabico/UFRGS. 

Rede Campos Sulinos - EcoAgência

  
  
  
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