Débora Gallas e Sarah Motter*
Este sábado, 14 de março, é marcado como “Dia Internacional de Luta contra as barragens, pelos rios, pela água e pela vida”. O Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB), aliado à Jornada Nacional de Lutas do MST e demais apoiadores, manifestou-se nessa semana em 14 estados (SP, RO, PA, RS, SC, PR, BA, PI, PB, CE, MG, DF, MT, TO) para denunciar as violações de direitos humanos nas construções das barragens. O movimento também cobrou a criação de uma Política Nacional de Direitos para as Populações Atingidas por Barragens (PNAB), apesar disso, apenas os governos de Minas Gerais e do Ceará comprometeram-se em criar uma Política Estadual sobre o tema.
As hidrelétricas, além de causar um imenso impacto social ao desalojar comunidades de seus espaços e identidades, também causam impactos ambientais. Ao contrário do que o governo brasileiro afirma, as hidrelétricas não geram energia limpa. As barragens necessárias para o funcionamento dessas usinas formam imensos lagos os quais são grandes repositórios de matéria orgânica. A decomposição desses resíduos gera a emissão de metano, dentre outros gases de efeito estufa, e por consequência a mudança climática em curso. Esses empreendimentos também têm consequências na flora e fauna que, muitas vezes endêmicas, são ameaçadas de extinção.
A alternativa à geração de energia por usinas hidrelétricas no Brasil, defendida também por pesquisadores como Philip Feanrside, do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (Inpa), é que se faça um real investimento em energias renováveis como a eólica e a solar. Concordamos que, principalmente esta última mereça ganhar muito mais espaço, assim como incentivos dos governos, por meio de linhas de crédito para a aquisição de equipamentos e instalação de energia solar fotovoltaica em residências.
Há cerca de um mês, a EcoAgência noticiou a realização de uma audiência pública sobre o complexo binacional das hidrelétricas de Garabi-Panambi. Na reunião, habitantes dos 24 municípios que serão atingidos, caso seja construído o complexo hidro-energético no noroeste gaúcho, e representantes de movimentos socioambientais manifestaram-se contrários ao projeto. Além da degradação ambiental e os impactos sociais já sofridos por aquelas pessoas e ecossistemas, decorrentes do funcionamento dos sete barramentos já existentes no rio Uruguai (Itá, Foz de Chapecó, Machadinho, Passo Fundo, Barra Grande, Campos Novos no Brasil e Salto Grande que é binacional Argentina-Uruguai), os participantes da audiência pública afirmaram que aquele é o único trecho ainda livre. Construir Garabi e Panambi será o mesmo que decretar a morte do rio Uruguai, afirmaram. A população reivindicou formalmente o “direito de dizer ‘não’” ao projeto. Este direito vai ser respeitado pelos governos?
Ética para a água
Não podemos mais adiar a mudança do olhar utilitarista sobre a água para um olhar integrador, a fim de que possamos compreender as conexões que tornaram a vida possível e permitir a manutenção da nossa existência. “Precisamos construir uma nova ética para a água,” afirmou o professor do Instituto de Geociências da UFRGS, Rualdo Menegat, nessa semana durante o Ciclo de Palestras 2015 da Fundação Gaia em Porto Alegre.
Conforme Menegat, a contaminação, o despejo de rejeitos e a construção de inúmeras represas, por exemplo, evidenciam a urgência de uma reflexão sobre as relações da humanidade com a água. Explicou que as cidades precisam ler o mundo hídrico e viver de maneira integral com os sistemas terrestres, inspirando-se em saberes já construídos por outras sociedades.
Por meio da construção de hidrelétricas, a civilização demonstra ignorar as conexões que as águas estabelecem e que garantem a existência da vida no Planeta, priorizando o progresso das cidades e o desenvolvimento econômico das nações. Diante dessas intervenções nos rios, que causam desequilíbrio do ecossistema e danos profundos às comunidades que acompanham o curso das águas, precisamos urgentemente cogitar alternativas para esse modelo de produção energética. Acreditamos que é possível construir coletivamente caminhos que nos levem a viver num mundo de respeito à biodiversidade, às diversidades culturais e biológicas e aos ciclos de Gaia.
*Edição: Eliege Fante