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Terça-feira, 01 de Setembro de 2015
  
Métodos alternativos ao uso de animais em pesquisas: Questões sobre processos e competências regulatórias

Como discutir métodos alternativos de redução ou de substituição se não sabemos o quantitativo atual de animais utilizados? A própria discussão da restrição fica comprometida, porque ela envolve o estabelecimento de metas, reduzir de um patamar para outro em um espaço de tempo definido.

  
Por Ana Tereza Pinto Filipecki, Silvio Valle e Márcia de Oliveira Teixeira
  

A ampliação das restrições ao uso de animais em pesquisas científicas no Brasil tem sido alvo de inúmeros debates entre especialistas e não especialistas. É o caso do evento “Seminário Sobre Internalização de Métodos Alternativos ao Uso de Animais”, que será organizado pela ANVISA (16/09/2015 em Brasília), além das atividades promovidas pela Rede Nacional de Métodos Alternativos.

A Diretriz Brasileira para o Cuidado e a Utilização de Animais para Fins Científicos e Didáticos (Resolução Normativa N° 12/2013) não define Métodos ou Técnicas Alternativas, entretanto, “ressalta as responsabilidades de todos que utilizam animais para (c) promover o desenvolvimento e uso de técnicas que substituam o uso de animais em atividades científicas ou didáticas (1.2)”. Na Diretriz, a substituição é um dos princípios gerais para o cuidado e utilização de animais para fins científicos e didáticos, estabelecendo que “As propostas de utilização de animais para fins científicos ou didáticos devem considerar a substituição dos animais por Métodos Alternativos Validados” (IV2).

A despeito da importância e interesse público despertado pelo uso de animais em pesquisa, algumas questões e atores implicados com a “ampliação das restrições” são pouquíssimo debatidos e estão longe da programação principal dos eventos científicos e das manchetes da mídia. Questões que chamam nossa atenção.

O esquecimento de alguns atores fundamentais para a implementação da atual regulação. Em geral, o debate se atém à ação das CEUAs, ao CONCEA, às entidades e associações científicas, algumas sociedades protetoras dos animais e aos ativistas radicais. O MS, o MAPA e o MEC, além do Ministério Público permanecem na penumbra. Muitos desconhecem, por exemplo, quais são as atribuições concretas e detalhadas da ANVISA (MS), da SDA/MAPA e do IBAMA/MMA. É preciso desenvolver uma compreensão mais ampliada das competências de cada um desses atores, sobretudo, em relação a uma parte mais sensível da legislação, qual seja a fiscalização.

Outra questão diz respeito aos ‘Métodos Alternativos’. O seu debate sobre o uso de animais em pesquisas é de fundamental importância. Contudo ainda pairam muitas dúvidas sobre alguns pontos. Por exemplo, quais Métodos Alternativos estão disponíveis e acessíveis às instituições de pesquisa e em especial de ensino nacionais? Quantos animais são efetivamente utilizados, por técnicas tradicionais anualmente pelas instituições? Para reduzir o seu número temos que ter conhecimento quantitativo e qualitativo dos animais utilizados.

É surpreendente, mas não dispomos de estatísticas confiáveis sobre o número de animais utilizados. Não acontecendo por falta de legislação. A Lei de Biossegurança de 1985 criou o sistema CTNBio/CIBio, regulando o uso de animais transgênicos por pessoas jurídicas devidamente credenciadas. Porém, passados 20 anos ainda não temos informações precisas sobre número de animais geneticamente modificados utilizados em pesquisa.

Não obstante a Lei de Biossegurança, de aplicação aos animais geneticamente modificados, em 2008 o Congresso Nacional aprovou a Lei N° 11.794 aplicável a todos os animais para fins científicos (filo Chordata e sufilo Vertebrata). Essas legislações em tese nos permitiriam construir uma base de dados sobre o número de animais utilizados. Mas até a presente data não existe nenhum dado, mesmo provisório, disponível para a sociedade. Como discutir métodos alternativos de redução ou de substituição se não sabemos o quantitativo atual de animais utilizados? No limite, a própria discussão da restrição fica comprometida. Porque ela envolve o estabelecimento de metas, reduzir de um patamar para outro em um espaço de tempo definido.

Quando pensamos em quais métodos estão disponíveis outros pontos causam no mínimo surpresa. O CONCEA reconheceu uma série de Métodos Alternativos. No entanto, a ANVISA se reserva o direito de ratificar quais métodos serão adotados por ela. Imaginem no caso da análise do princípio ativo de algum agrotóxico, que o método seja aceito pelo SDA/MAPA, aceito com restrições pela ANVISA e não aceito pelo IBAMA. Quem decide como fica o setor regulado? Quem regula o quê quando o tema é Métodos Alternativos?

Outro ponto crítico com relação ao uso de animais em pesquisa, com implicações para a adoção dos Métodos Alternativos, é a falta de clareza quanto à fiscalização, seja no tocante ao processo seja em relação às competências claras para fiscalizar.

A Lei N° 11.105/2005 prevê no Artigo 16 que “caberá aos órgãos e entidades de registro e fiscalização do Ministério da Saúde, do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento e do Ministério do Meio Ambiente”. Até hoje essa atividade não foi devidamente implementada para a fiscalização do uso de animais geneticamente modificados em pesquisa.

A Lei N° 11.794/2008 estabelece no Artigo 21 que “a fiscalização das atividades reguladas por esta Lei fica a cargo dos órgãos dos Ministérios da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, da Saúde, e do Meio Ambiente, nas respectivas áreas de competência”.  O Decreto (N° 6.899/2009) que regulamenta a Lei N° 11.794/2008 (a composição, funcionamento e resoluções do CONCEA), a Resolução Normativa N° 24/2015 do CONCEA não deixa clara a função de cada órgão de Vigilância com competência legal para exercer a fiscalização. E notem que o aparato Bioburocrático nacional não é pequeno e tampouco tímido.

O uso de animais em pesquisa é um tema estratégico para pesquisa em saúde e de alta transversalidade. Sendo assim, os órgãos governamentais devem estabelecer uma política na qual a função, atuação e atribuições de cada órgão de governo estejam definidas de forma clara, hierarquizada e descentralizada. Caso não tenhamos regras claras e fiscalização efetiva é iminente que a legislação sobre o uso de animais em pesquisas entre para o rol das chamadas “Leis que não pegam”.

Com relação aos Métodos alternativos é importante o CONCEA e os demais órgãos envolvidos na sua regulamentação discutirem o reconhecimento automático de todos os Métodos Alternativos validados por órgãos internacionais e com aceitação regulatória no Brasil. Essa decisão estaria amparada no Art. 5º Inciso IV da Lei N° 11.974/2008 “estabelecer e rever, periodicamente, as normas para uso e cuidados com animais para ensino e pesquisa, em consonância com as convenções internacionais das quais o Brasil seja signatário”.

– Autores:

* – Ana Tereza Pinto Filipecki, doutora e pesquisadora do Laboratório de Iniciação Científica na Educação Básica da Escola Politécnica de Saúde Joaquim Venâncio, Fundação Oswaldo Cruz, afilipecki@fiocruz.br

- Silvio Valle, pesquisador do LATEC da Escola Politécnica de Saúde Joaquim Venâncio, Fundação Oswaldo Cruz, valle.fiocruz@fiocruz.br

- Márcia de Oliveira Teixeira, doutora e pesquisadora adjunta do Laboratório de Manutenção de Equipamentos da Escola Politécnica de Saúde Joaquim Venâncio, Fundação Oswaldo Cruz e docente no Programa de Pós-Graduação em Informação e Comunicação e Inovação em Saúde (PPGICS-FIOCRUZ), marciat@fiocruz.br

 

  
             
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