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Quarta-feira, 11 de Novembro de 2015
  
Bento Rodrigues: uma história que se repete como tragédia

O histórico de acidentes provocados por obras de mineradoras no Brasil e no mundo revela o descaso de empresas e autoridades públicas.

  
Por INESC
  

A tragédia de Bento Rodrigues, distrito de Mariana (MG), não é a primeira causada pela atividade de extração mineral no Brasil. Infelizmente o histórico é antigo, remontando ao tempo colonial, há mais de 300 anos. As consequências do rompimento das barragens de Fundão e de Santarém, da empresa Samarco, são um triste 'déjà vu' de irresponsabilidade socioambiental do setor de mineração no país, e tanto as mineradoras quanto o Poder Público sempre demonstraram descaso com a proteção de direitos das populações que vivem nas áreas de influência dos projetos e com o meio ambiente.



No caso de Bento Rodrigues, o Ministério Público de Minas Gerais abriu inquérito para apurar causas e responsabilidades; a presidenta Dilma Rousseff colocou a Força Nacional para auxiliar nas buscas dos 26 desaparecidos; o governador Fernando Pimentel (PT) sobrevoou a região do acidente e as áreas atingidas pelo lamaçal de rejeitos de minério de ferro das minas da Samarco em Mariana (MG), prometendo apoio aos mais de 500 desabrigados, mas as medidas são meramente paliativas quando se tem um quadro generalizado de desrespeito às regras de segurança, à lei e ao estado de direito pelo setor de mineração em relação à ocupação de terras, condicionantes socioambientais e transparência em suas atividades.



O acidente nas barragens da Samarco, empresa que pertence em parcelas societárias iguais à brasileira Vale (maior produtora de minério de ferro do mundo) e à anglo-australiana BHP Hillinton (maior mineradora do mundo), não é um caso isolado. É mais uma tragédia na longa e vergonhosa lista de irresponsabilidades do setor de mineração – no Brasil e no mundo.


Minas Gerais é o Estado brasileiro com o maior número de ocorrências desse tipo nos últimos anos. Em 2014, três operários morreram no rompimento de uma barragem de uma mina da empresa Mineração Herculano em Itabirito. Outra barragem da mesma companhia foi interditada na época por risco de ruir. Em 1986, Itabirito sofreu outro acidente, ainda pior, com 7 mortes e muitos danos ambientais, causado por rompimento de barragem de rejeitos da Mina de Fernandinho, do grupo Itaminas.

Em 2007, a barragem com rejeitos de bauxita da mineradora Rio Pomba Cataguases rompeu e inundou as cidades de Miraí e Muriaé, deixando cerca de 4 mil pessoas desabrigadas. Em 2006, outro acidente grave com resíduos de tratamento de bauxita atingiu um córrego da região. Cinco anos antes (2001), cinco operários morreram com o rompimento de outra barragem de resíduos de mineração, desta vez em Nova Lima, região metropolitana de Belo Horizonte. Além das mortes, provocou assoreamento e poluição dos rios e destruiu as matas ciliares.



Em 1984, a maior tragédia em número de perdas de vidas humanas: 31 trabalhadores morreram na Mina Santana em Santa Catarina da extinta Companhia Carbonífera de Urussanga, após uma explosão a 80 metros de profundidade.



Especialistas apontam alguns problemas recorrentes nessas tragédias. A falta de estudos prévios sobre os projetos e de inspeção contínua das obras por parte das autoridades públicas estão entre as principais. Considerando que a atividade de mineração no Brasil tem aumentado significativamente nos últimos anos – tem peso significativo nas exportações brasileiras de matérias-primas -, preocupa a leniência com que é tratada. E o pior está por vir.

Há um Novo Código da Mineração em discussão no Congresso e esse debate está sob controle total das grandes mineradoras, principais doadoras das campanhas de vários parlamentares a cargo do tema. Esse Novo Código dará mais poderes a um setor que avança na exploração de recursos naturais do país sem proteger direitos das populações que vivem nas áreas de influência dos projetos.

Tragédias com apropriação ilegal de terras, contaminação de mananciais de água e acidentes com incalculáveis prejuízos ambientais e humanos se sucedem sem que os órgãos fiscalizadores responsáveis consigam punir e, mais importante, impedir que tais crimes aconteçam. E o Novo Código não só não discute essas questões como alivia ainda mais a responsabilidade das empresas e a fiscalização do Poder Público.



Como se não bastasse, o projeto de lei estadual 2.946/2015, de autoria do atual governador mineiro, Fernando Pimentel (PT), fragiliza ainda mais os instrumentos de controle e proteção para empreendimentos como os da mineração no Estado de Minas. O projeto reduz o tempo para a concessão do licenciamento ambiental em Minas, o que pode ampliar os conflitos sociais associados a grandes projetos e os danos ambientais.

Tanto o Novo Código da Mineração como o projeto de lei em discussão em Minas Gerais serão incapazes de evitar novas tragédias, algumas anunciadas. Mais do que isto, ampliarão o risco de novas tragédias. Em Congonhas (MG), a mina Casa de Pedra, da Companhia Siderúrgica Nacional (CSN) é alvo de uma série de denúncias de irregularidades nas obras de construção e ampliação de barragens de rejeitos.

Em Alvorada de Minas e Conceição do Mato Dentro, também em Minas, há flagrantes ilegalidades no processo de outorga para a barragem de rejeitos do sistema Minas-Rio, da mineradora Anglo American.



Só em Minas Gerais há cerca de 750 barragens para despejo de resíduos, 60% delas (450) usada por mineradoras. Levantamento da Fundação Estadual do Meio Ambiente aponta que pelo menos 35 delas não têm segurança adequada, ou status de 'estabilidade garantida'. As duas barragens de Bento Rodrigues tinham esse “selo de garantia” e ainda assim se romperam.

Que a tragédia de Bento Rodrigues sirva de exemplo, ainda que cruel, para que a atividade do setor de mineração no Brasil seja melhor regulada e as empresas responsáveis cumpram seu papel de garantir os direitos ambientais e sociais nas regiões onde atua. Os brasileiros não querem mais mortes e destruição como 'contrapartida' da exploração e exportação de matéria-prima mineral. Esse é um custo inadmissível que o país não mais pode tolerar.
 

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*Instituto de Estudos Socioeconômicos - INESC, membro do Comitê Nacional em Defesa dos Territórios

  
             
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