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Mineração

Segunda-feira, 12 de Dezembro de 2016

 
     

População resiste à ameaça da mineração em uma das áreas mais conservadas do Pampa gaúcho

  

Votorantim apresenta empreendimento em Minas do Camaquã através do potencial de geração de empregos na região, mas habitantes e comunidade acadêmica questionam os riscos que a extração de chumbo deve trazer à população e à bacia do Rio Camaquã

 

  

Débora Gallas    
Público presente na audiência em Santana da Boa Vista (RS)


Por Débora Gallas - especial para a EcoAgência

Entre os dias 22 e 24 de novembro, a Votorantim Metais Holding apresentou às populações de Santana da Boa Vista, Bagé e Pinheiro Machado o seu projeto “Caçapava do Sul” em parceria com a canadense IamGold, que prevê a instalação do empreendimento de mineração no distrito de Minas do Camaquã, região sudeste do Rio Grande do Sul. No local, a empresa pretende extrair chumbo, cobre e zinco em três cavas, com início das operações em 2020. As audiências públicas nesses três municípios foram determinadas pelo Ministério Público Estadual, no entendimento de que também seriam impactados pelo projeto, que está em fase de Licenciamento Prévio junto à Fundação Estadual de Proteção ao Meio Ambiente Henrique Luiz Roessler (Fepam).

 

Também participaram dos eventos, pesquisadores de diversas universidades gaúchas e da Embrapa Pecuária Sul, especializados na pesquisa e desenvolvimento da região que é uma das mais conservadas do bioma. Nesta semana, a Secretaria de Ambiente e Desenvolvimento Sustentável (Sema) e o Ministério Público Estadual, receberam as manifestações de entidades sediadas em Porto Alegre e integrantes de uma federação internacional. O Instituto Gaúcho de Estudos Ambientais (InGá), dentre outros aspectos, alerta que o empreendimento é de altíssimo risco porque a região integra o Mapa das Áreas Prioritárias para a Biodiversidade e, a área está na categoria máxima “Extrema Importância”. E, o Núcleo Amigos da Terra Brasil denuncia a omissão da exploração de prata e ouro, sendo que o próprio EIA-RIMA da empresa indica a presença de prata na região. “A principal sócia da Votorantim no projeto, a multinacional canadense IamGold, além de ter ouro no próprio nome apresenta em seu site seu trabalho de mineração do elemento pelo mundo todo, deixando um rastro de violação de direitos pelos territórios onde passa,” afirmam no documento.

 

Segundo a Votorantim, trata-se de um projeto "inovador" porque prevê o depósito de rejeitos em uma pilha a seco, submetidos a drenagem e a impermeabilização, com revegetação total da área após o fechamento da mina. Na audiência de Santana da Boa Vista, que reuniu mais de 600 pessoas no dia 22 de novembro, o engenheiro responsável pelo projeto da Votorantim, Paul Cezanne Pinto, também destacou o fato de o empreendimento dispensar o uso de barragem. Na oportunidade, o oceanógrafo e professor aposentado da Universidade Federal do Rio Grande Antônio Philomena questionou a segurança do método. "Não pensem que a seco não pode ter problema. Eu até aceitaria se todos os rejeitos fossem colocados de volta no buraco. Por que não põem? Porque não é economicamente viável", afirmou.

 

Em sua manifestação na audiência, o professor do Departamento de Ecologia da UFRGS e coordenador da Rede Campos Sulinos, Valério De Patta Pillar, questionou a responsabilidade pela área minerada após os vinte anos de vida útil previstos pelo empreendimento. "Quem cuidará das pilhas de rejeito pela eternidade?", perguntou à mesa, destacando que o risco de contaminação não se encerra com o período de exploração da área. O professor também chamou a atenção para o desrespeito à ordem de inscrição. Além dele, outras pessoas que chegaram cedo puderam fazer uso da palavra somente no final da tarde. Renato Chagas, diretor do Departamento de Controle da Fepam e mediador da audiência, assumiu o erro e afirmou que o fato não se repetiria nos encontros seguintes.

 

Riscos

 

Durante a audiência, ocorreram diversas manifestações de preocupação da comunidade com os baixos índices de Santana da Boa Vista no Índice Municipal de Desenvolvimento Humano (0,633, um dos mais baixos do Rio Grande do Sul), sobretudo nos indicadores referentes à escolaridade. Tais dados foram destacados durante a apresentação do empreendimento pela Votorantim. Os políticos da região, em maioria, exaltaram o empreendimento como uma "luz no fim do túnel" em tempos de crise e oportunidade de alavancar o desempenho dos municípios. Os prefeitos eleitos de Santana da Boa Vista e Caçapava do Sul, Arilton de Oliveira Freitas (PT) e Otomar Vivian (PP), por exemplo declararam apoio irrestrito à iniciativa da Votorantim.

 

Boa parte dos moradores de Santana da Boa Vista expressou dúvidas em relação aos 450 empregos que o empreendimento promete gerar após a fase de instalação da mina. Enquanto a Votorantim afirma ter a intenção de colaborar com a educação na região, pois sua política interna prevê a contratação de funcionários com pelo menos o ensino fundamental completo, diversas manifestações ressaltaram que o projeto não detalha as funções para as quais a empresa necessitará contratar e o nível de formação requerido para tais vagas.

 

Já os habitantes de Palmas, localidade de Bagé banhada pelo Rio Camaquã, afirmam que não foram consultados e que temem pelos riscos de contaminação por chumbo na região. "O rio não tem somente uma margem", destacou a moradora Vera Collares, referindo-se ao fato de o Estudo de Impacto Ambiental trazer como Área de Influência Indireta do empreendimento somente os municípios de Caçapava do Sul e Santana da Boa Vista. A comunidade de São Lourenço do Sul, município onde o Camaquã deságua na Laguna dos Patos, também manifestou preocupação com os impactos. A bióloga e professora Ana Rolon ressaltou que a supressão de nascentes afeta todo o curso do rio, e postulou que o método adotado no EIA/RIMA para avaliação da vegetação herbácea no bioma Pampa não foi capaz de contemplar a toda a biodiversidade da região.

 

EIA/RIMA criticado, projeto desconhecido

 

A equipe da Votorantim e o coordenador técnico do Estudo de Impacto Ambiental e do Relatório de Impacto ao Meio Ambiente (EIA/RIMA), Ivanor Sinigaglia, quando questionados pelo público de Santana da Boa Vista a respeito dos impactos do empreendimento, assumiram que não há mineração sem riscos. No entanto, não expuseram objetivamente quais seriam esses riscos. Renato Chagas, da Fepam, declarou que o papel do órgão é "avaliar se as medidas propostas pelo empreendedor causarão o menor dano possível". Paul Cezanne preocupou-se em ressaltar que o projeto não envolve metalurgia e transformação química dos minerais. Somente perto do final da audiência, o engenheiro declarou que o projeto da empresa prevê a construção de dique para conter a pilha de rejeitos.

 

Professora da FURG no campus São Lourenço do Sul, Marlene Melo afirmou que a vida vegetal não sobrevive à quantidade de chumbo que será trazida à superfície, e que a membrana de plástico prevista para o isolamento da área minerada não é suficiente para proteger o ambiente. Segundo a professora, que tem formação em Química, as cavas deverão sofrer impacto do assoreamento e "a chuva vai levar chumbo iônico para corpos d`água". Ela citou um acidente de mineração ocorrido no Peru, em 2012, no qual a Votorantim foi uma das empresas envolvidas. De acordo com Marlene, entre as consequências registradas da contaminação de 10 quilômetros do Rio Huallaga por metais pesados, estavam doenças ósseas e câncer.

 

De acordo com a professora do Instituto de Ciências Biológicas da FURG Jaqueline Durigon, o EIA/RIMA apresenta erros conceituais, como o de bacia hidrográfica. De acordo com resolução do Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama), a área de influência do empreendimento tem que envolver toda a bacia, não somente onde há uso da água, ressaltou. A professora também sustentou que as curvas de suficiência amostral que os técnicos alegam ter atingido não foi baseada em bibliografia de referência, e que as amostragens de flora campestre e o número de campanhas para avaliação do meio biótico foram insuficientes para se afirmar que o empreendimento é viável. Jaqueline frisou que, entre as espécies ameaçadas da flora, 11 foram encontradas, "mas há mais 45 espécies de ocorrência na área que não foram encontradas durante a campanha. Houve esforço amostral muito pequeno". E completou: "É uma área que a gente ainda desconhece e que vai acabar. E eles colocam como impacto positivo do projeto maior conhecimento da biodiversidade. O que tu vais conhecer destruindo o habitat natural dessas espécies?".

 

Preocupação dos produtores locais

 

Atualmente, a principal atividade econômica da região é a agropecuária. Os produtores familiares e profissionais ligados à Associação de Produtores Locais do Alto Camaquã destacaram que o EIA/RIMA não detalha a população animal da região, composta principalmente por bovinos, ovinos e caprinos. O grupo também teme que a carne produzida na região seja desvalorizada no mercado, já que os rebanhos estão em áreas com risco de contaminação pela atividade minerária. Alguns produtores lembraram que, há cerca de uma década, a região havia sido alvo de outro empreendimento do Grupo Votorantim: a plantação de eucaliptos em parceria com a Votorantim Celulose e Papel - atual Fibria. Segundo o grupo, a desistência das empresas de celulose envolvidas no cultivo deixou diversos produtores desamparados.

 

Apoie o abaixo-assinado contra a mineração no rio Camaquã

 

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EcoAgência

  
  
  
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