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Sexta-feira, 10 de Fevereiro de 2017

 
     

Servidores apontam controvérsias na proposta de “reestruturação†dos órgãos ambientais do RS

  
A Terça Ecológica tratou do desmonte dos órgãos ambientais do Rio Grande do Sul e a ameaça de extinção da FZB; participantes questionam as medidas do governo estadual justificadas pelo “corte” de despesas
  

NEJ-RS    
À mesa: vice-diretora da Fabico e diretora de comunicação do NEJ-RS Ilza Girardi, Jan Karel, Rafael Erling e o presidente da Associação dos Servidores da SEMA Julio Rolhano


Por Eliege Fante e Débora Gallas - especial para a EcoAgência

 

O Núcleo de Ecojornalistas do Rio Grande do Sul (NEJ-RS), em parceria com a Fundação Luterana de Diaconia (FLD), realizou nesta semana (dia 7) a edição da Terça Ecológica que debateu o desmonte dos órgãos ambientais do Rio Grande do Sul. No encontro, que reuniu servidores estaduais e municipais, ambientalistas, cidadãos e cidadãs, estudantes e jornalistas, os participantes também abordaram estratégias de mobilização frente a medidas como a ameaça de extinção da Fundação Zoobotânica do Rio Grande do Sul (FZB) e a crescente precarização do trabalho na Secretaria Estadual do Ambiente e Desenvolvimento Sustentável (SEMA)  e esvaziamento de diversos de seus setores.

 

De acordo com Rafael Caruso Erling, técnico ambiental da SEMA, questões administrativas dificultam a Secretaria de cumprir com suas próprias atribuições legais, citando estudo realizado entre 2013 e 2014 que verificou demanda de concurso público para nomear 200 servidores. O único concurso realizado pela SEMA foi em 2007, frisou Rafael. "Com o número de servidores que temos hoje, não há a menor condição de incorporação das atribuições da Fundação Zoobotânica." O técnico observou que a Secretaria não tem estrutura nem quadro capacitado para gerir, acompanhar e fiscalizar convênios, contratos e parcerias com o setor privado. Por isso, a SEMA não tem como suprir a lacuna que será deixada se a FZB for extinta.

 

Além disso, a FZB detém atribuições exclusivas como manter o maior acervo de material testemunho da biodiversidade do RS por ser credenciada como instituição fiel depositária no Conselho de Gestão do Patrimônio Genético do Ministério do Meio Ambiente (CGEN/MMA); elaborar os laudos paleontológicos sem os quais obras em estradas e outros empreendimentos em áreas de sítios paleontológicos não podem avançar; extrair o veneno das serpentes, sendo a FZB a única fornecedora da peçonha para a produção do soro antiofídico no Sul do Brasil; elaborar as listas de espécies da fauna e da flora ameaçadas de extinção e os respectivos planos de ação; executar os planos de manejo conforme acordado com a Justiça com prazo estabelecido pelo Ministério Público Estadual, como no da ação civil pública contra o governo do Rio Grande do Sul referente à preservação da Área de Proteção Ambiental (APA) do Banhado Grande; ser o único órgão do RS que executa a Política Estadual de Educação Ambiental, responsável por atender mais de 200 mil estudantes e professores a cada ano.

 

Referente ao discurso de que o Estado pode vir a contratar empresas de consultorias privadas para realizar o trabalho da FZB, os técnicos ambientais concordam que o aumento das despesas ao erário público será inevitável. Para ilustrar, mostraram a economia que o RS teve quando a FZB elaborou o plano de manejo do Parque Estadual do Delta do Jacuí (quatorze mil hectares) pelo valor de R$ 176 mil, sendo que o montante entregue à consultoria privada que fez o plano de manejo da APA do Delta do Jacuí (oito mil hectares) foi R$ 948 mil. Maior ainda foi a economia do Estado ao contar com a elaboração dos planos de manejo da Rebio Mata Paludosa, Revis Banhado dos Pachecos, APA Rota do Sol e ESEC Aratinga ao investir um total de R$ 660 mil, já que se houvesse contratação de consultorias privadas o gasto teria sido de R$ 5.586.504 milhões. A realização do Zoneamento Econômico Ecológico, um projeto fundamental e estratégico para o Estado sob diversos aspectos, graças aos dados de pesquisas da FZB e da Fundação de Economia e Estatística (FEE) teve o valor de R$ 10 mil. Ao passo que se o mesmo trabalho tivesse sido realizado por uma consultoria a estimativa é de que o custo teria sido seis vezes superior.  

 

O desmonte dos órgãos ambientais resulta, na prática, no desmonte da política ambiental do RS. O biólogo e integrante da Associação de Servidores da FZB Jan Karel Mahler Jr. apresentou algumas evidências: emissão online de licenças de operação para empreendimentos; municipalização do licenciamento sem os devidos critérios; exclusão do licenciamento para a silvicultura; sucateamento das unidades de conservação; sistemática troca de chefias e realocação de servidores; fechamento do laboratório de Biologia da Fepam cujo patrimônio abandonado tornou-se entulho e teve empresa contratada sem licitação para removê-lo; desconsideração de diretrizes no licenciamento como em relação às áreas úmidas e espécies ameaçadas; desestruturação do sistema de informática da Fepam.  

 

Para Jan Karel, a preocupação com as decisões políticas ultrapassa os órgãos ambientais, já que há "muita permissividade em todas as esferas, federal, estadual e municipal". Ele ressaltou a ameaça de extinção da Secretaria Municipal do Meio Ambiente de Porto Alegre (SMAM), que já teve o licenciamento ambiental eliminado de suas competências, e o decreto de regularização do Cadastro Ambiental Rural no RS, que flexibilizava a exigência de reserva legal em propriedades do bioma Pampa, ponto inviabilizado por meio de liminar da Justiça em dezembro de 2015.

 

A análise do público da Terça Ecológica sobre a desestruturação vigente, embora denominada “reestruturação” pelo governo e fartamente repetida pela imprensa hegemônica, é de que corresponde a conjuntura global na qual predominam os discursos em defesa do “Estado Mínimo”. Isso ocorre, essencialmente, através da venda, cessão e concessão de patrimônio público. Quanto à demissão de servidores públicos com vistas à crescente terceirização de suas funções, ainda que seja justificada com a dita “agilização” do cumprimento das obrigações do Estado, resulta na prática no abandono do cumprimento dessas obrigações constitucionais e, diretamente, no comprometimento da qualidade do serviço prestado. Por fim, todos ficam expostos aos riscos da tomada de decisões políticas baseadas em análises superficiais, incompletas e insuficientes.

 

Alerta contra o desmonte

O alerta do desmonte dos órgãos ambientais e da política ambiental do RS vem sendo feito e, em 2015, no início do Governo Sartori, a Assembleia Permanente de Entidades em Defesa do Meio Ambiente (APEDeMA-RS) manifestou a insatisfação com a escolha de Ana Maria Pellini como secretária da pasta por não ter o “perfil mínimo de formação na área”. Manifestou também indignação com a substituição da SEMA pela SEADES (Secretaria do Ambiente e Desenvolvimento Sustentável), o que implicou na perda de foco da pasta ambiental em favor de “atribuições polêmicas, que se sobrepõem a outras pastas (desenvolvimento, educação ambiental formal)”. Como se isso não fosse o suficiente, a APEDeMA-RS cobrava os “resultados efetivos de melhorias à secretaria após a Operação Concutare, revisando-se as licenças ilegais, a punição aos responsáveis, incrementando-se os mecanismos de controle interno, a transparência externa, o fortalecimento e valorização do papel do Consema para as políticas ambientais do RS.”

 

O que se viu desde então foi a sistemática fragilização da SEMA e a pressão do Executivo para extinguir a FZB com o derrotado, pela mobilização popular, Projeto de Lei 300 de 2015 e a sua transformação em PL 246 de 2016, votado em 30 dias sem a defesa de nenhum deputado da base do Governo Sartori (PMDB), o qual autorizou a extinção da Fundação responsável pelo Museu de Ciências Naturais (61 anos), Jardim Botânico (57 anos) e Parque Zoológico (54 anos). Mas isto ainda culmina na desestruturação do Conselho Estadual do Meio Ambiente (Consema), com a perda significativa de conselheiros representantes da área técnica ambiental.

 

Desestruturação do Sisepra

Hoje, 9 de fevereiro de 2017, o Consema discutiu o anteprojeto de lei que “altera, acresce e revoga os dispositivos da Lei 10.330 de 27 de dezembro de 1994, que disciplina o Sisepra, acresce dispositivos na Lei 11.520 de 3 de agosto de 2000 que institui o Código Estadual do Meio Ambiente e revoga dispositivos da Lei 11.738 de 13 de janeiro de 2002 e dá outras providências”. Em seu primeiro artigo, fica determinada a exclusão da FZB na composição do Sistema Estadual de Proteção Ambiental (Sisepra). E, no oitavo, estabelece o repasse à SEMA de atribuições da FZB como “gerir direta ou indiretamente” o Jardim Botânico, o acervo do Museu de Ciências Naturais e o Parque Zoológico. Como justificativa, consta “o fortalecimento” da gestão ambiental do Estado e “salienta” que o referido anteprojeto de lei “aperfeiçoa a legislação de proteção ambiental no território do Estado do RS”.

 

É importante ressaltar ainda que a Lei 11.738 citada no anteprojeto mas não especificada é a que “declara integrantes do patrimônio cultural do Estado os sítios paleontológicos localizados em municípios do Estado do Rio Grande do Sul”. O que o anteprojeto faz com ela é revogar os artigos terceiro e quarto que responsabilizam a FZB pela administração e supervisão científica, e determina que a gestão dos sítios paleontológicos bem como a supervisão científica passe a ser atribuição da SEMA. Entretanto, nem mesmo hoje na reunião do Conselho, a SEMA conseguiu explicar como vai conseguir absorver esta e todas as demais atribuições da Fundação sem os especialistas, se contratando cargos em comissão (CCs) ou terceirizados. Já que os servidores da SEMA divulgaram, ainda em dezembro de 2016, um documento no qual afirmam a impossibilidade de assumirem mais as atribuições do quadro técnico da Fundação: “Ao contrário do quadro de servidores da FZB, nós, servidores da SEMA, somos generalistas, com amplo conhecimento de diversos aspectos da gestão da biodiversidade. Justamente, a SEMA e a FZB se complementam e por isso a extinção da FZB traz prejuízos incomensuráveis aos trabalhos desta Secretaria”. 

 

O enfraquecimento e o desmonte de cada órgão integrante do Sistema Estadual de Proteção Ambiental (Sisepra) evidenciava que o alvo era mesmo o desmonte da política ambiental do RS. Ainda em 2015, a secretária Ana Maria Pellini culpou o Sistema pelos problemas ambientais enfrentados no RS. No debate sobre “A crise da política ambiental do RS”, a contabilista afirmou que o Sisepra não estava estruturado. Naquele momento, Leonardo Melgarejo, da Agapan, defendia “um plano de gestão ambiental” para o Estado, já que ainda na campanha eleitoral o candidato Sartori (PMDB) omitiu as propostas para o meio ambiente e não recebeu as propostas do movimento ambientalista. E, também, Melgarejo defendeu “o fortalecimento dos instrumentos do Sisepra”, destacando que a FZB é um dos principais.

 

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