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Sábado, 03 de Agosto de 2013
  
Salto do Yucumã: preservação sustentável ou exploração energética?

Será mesmo preciso arriscar perder um lugar de preservação e turismo, prejudicar o crescimento de uma região, causar o rompimento da relação de agricultores e ribeirinhos com sua fonte de trabalho e renda, para gerar uma energia que pode ser obtida de tantas outras formas? 

 
  
Por Andreia Primaz Eckhard
  
Abrigando dezenas de espécies raras de plantas e animais e o maior salto longitudinal do mundo - o Salto do Yucumã - , com 1.800 km de extensão, o Parque do Turvo é um importante ponto turístico da região e o mais importante de Derrubadas (RS), que conta também com o turismo rural, onde visitantes, além de conhecerem uma das Sete Maravilhas do estado, também tem a oportunidade de conhecer cachoeiras, trilhas, propriedades rurais que ainda preservam a produção com pouca tecnologia e voltadas à produção familiar. O Parque do Turvo é um dos maiores do país e possui uma cobertura de mata nativa de mais de 17 mil hectares. 
 
Segundo o secretário do Turismo de Derrubadas, Ezequiel Weber, apesar das obras, como a conclusão asfáltica da estrada que liga os municípios de Derrubadas e Tenente Portela, a ERS 330, não houve elevação significativa no número de turistas, pois “a temporada passada foi bastante chuvosa e grande parte do tempo o Salto Yucumã ficou encoberto”. A  visibilidade do Salto está constantemente ameaçada porque as comportas das hidrelétricas já instaladas ao longo do rio Uruguai são abertas sem aviso prévio. Além disso, o secretário destaca que uma estagnação no número de turistas se deve ao fato de que poucas pessoas sabem do asfalto, que demorou mais de dois anos para ser concluído, e pela diminuição dos turistas argentinos com a desvalorização da moeda. 
 
O município vem passando por um processo de investimentos na área do turismo e nisso, encontramos também melhorias na cidade, como destacado pelo secretário Ezequiel. As ruas que ainda não possuíam, estão ganhando calçamento, também está sendo realizada a pintura de pórticos, construção de passeios, arborização e jardins. “Formamos uma equipe de monitores locais de ecoturismo devidamente treinados e capacitados para acompanhar e orientar excursões e pessoas que contratarem o serviço,” acrescenta o secretário.
 
Em questões estruturais dentro do Parque, o governo municipal investiu na construção de um centro para visitantes, onde funciona também o setor administrativo do local, uma casa para o guarda municipal e um local de reuniões e palestras. Também abriga um zoológico com animais empalhados e exposições de fotos.
 
Por um lado, estes investimentos somam para que essa maravilha da natureza seja preservada. Por outro, está a possível construção do Complexo Hidrelétrico Binacional Garabi e Panambi, nas cidades de Garruchos e Panambi (Argentina) e Alecrim (Brasil), respectivamente, que vem levantando muitas críticas sobre sua implantação no rio Uruguai.
 
O rio Uruguai com 2.200 km de extensão já tem quatro hidroelétricas ao longo de seu curso: Foz do Chapecó, Itá, Machadinho e Barra Grande.  Além destas, há também mais seis Pequenas Centrais Hidrelétricas (PCH) que estão localizadas, ainda no rio Pelotas, que são aquelas de menor porte na represa e também na capacidade de geração de energia.
 
Segundo dados divulgados pelos movimentos sociais que lutam contra a construção das barragens, só na região do rio Uruguai 60 mil pessoas perderam suas terras, de agricultura e de mata nativa, tudo pela exploração da energia sem se pensar nas consequências e no lado social implicado na desapropriação dessas áreas.
 
A população e os órgãos que são contrários às construções dessas barragens não estão tendo informações sobre o andamento dos estudos, mesmo que o direito de acesso esteja assegurado pela legislação nacional. Isso dificulta ainda mais o diálogo entre as partes, resultando na implantação indevida dessas usinas, expulsando pessoas de suas terras, sob ameaças e violência, tendo suas casas destruídas, obrigando-as a dar “espaço ao progresso”.
 
As empresas usam o discurso de que a instalação das usinas irá trazer inúmeros benefícios à comunidade, como emprego, turismo, melhorias para a vida das pessoas e, consequentemente, suficiência na geração de energia. Empresas estas que estão nas mãos de grandes transnacionais e que não geram retorno ao lugar onde se está explorando, o lucro vai para mãos de setores privados.
As Avaliações Ambientais Integradas (AAI) são os estudos realizados para avaliar quais as consequências e problemas ambientais decorrentes, bem como se é possível haver licenciamento para a construção, porém às vezes, esses estudos são forjados, atendendo a interesses específicos e não à preservação ambiental.
 
Ao longo de mais de 30 anos, estão sendo construídas várias Usinas no rio Uruguai que, segundo estudos feitos pelas empresas construtoras, não trariam nenhum dano ambiental ao local. A UHE Itá, rio Uruguai, entre os municípios de Itá (SC) e Aratiba (RS), está em funcionamento desde 2000. A usina alagou completamente a cidade catarinense que leva seu nome, diminuindo o turismo e acabando com a produção agrícola de mais de 10 mil hectares.
 
A usina hidrelétrica de Foz de Chapecó, localizada na foz do rio Chapecó, entre Alpestre (RS) e Águas de Chapecó (SC), está em
funcionamento desde 2010. Quando famílias não tiveram outra escolha e precisaram se retirar do local ou então, morreriam afogadas, acabaram sendo abrigadas em um Ginásio e hoje, não são contabilizadas como famílias atingidas.
A usina Machadinho localizada no rio Pelotas, entre as cidades de Piratuba (SC) e Maximiliano de Almeida (RS), está em funcionamento desde 2002. Esta usina atingiu mais de 3.500 famílias. 
 
O que os estudos nos dizem
Em 2010, o governo colocou no Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) a construção do Complexo Garabi - Panambi, impulsionando ainda mais o processo de estudo. Já são quase 40 anos desde o início das discussões para a construção do Complexo Hidrelétrico, em meio a protestos e problemas políticos. 
 
Esse estudo se faz necessário, pois é ele quem vai dizer se é possível ou não se ter uma represa d’água naquele local. É feito um levantamento de todas as características da região, como clima, temperatura, precipitação, insolação, umidade, radiação, entre outros aspectos. Além disso, também é feito o levantamento dos dados referentes à população, área rural e urbana, percentual que poderá ser alagado, áreas de unidades de conservação. Entre coletas e análises chega-se ao resultado sobre os danos ambientais.
Os estudos procuram indicar os impactos ambientais, quais as áreas que serão atingidas, a população indígena da região, enfim quais as consequências socioambientais decorrentes da instalação da usina.
 
Devido a tais consequências, o Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB) busca defender o interesse das famílias que são atingidas pela construção das barragens pelo Brasil todo. O movimento organiza manifestações, palestras e conscientiza a população ribeirinha sobre os problemas que serão enfrentados quando da retirada dessas, muitas vezes, sem receber nada em troca por suas terras, que antes representavam seu sustento.
 
Os interesses estão divididos, há pessoas a favor, outras não. A população não tem acesso a todos os dados relativos aos estudos e por isso, muitas vezes, são a favor, analisando o discurso das empresas privadas e públicas sobre os benefícios já citados.
O funcionário público da prefeitura municipal de Derrubadas, Marlom Geroldini, é a favor da construção das usinas, desde que os levantamentos ambientais garantam que o Parque Estadual do Turvo não irá ser prejudicado. Pois para ele o maior prejuízo será o Salto do Yucumã, que representa muito ao turismo derrubadense, porém ele ressalta também que, mesmo com o alagamento, ele poderá continuar sendo uma atração turística.  
 
Algumas iniciativas de debate sobre o assuntos são feitas na sociedade, por exemplo, em escolas onde se abrem espaços para discussão sobre os problemas que poderão afetar a cidade e o ponto turístico. O acadêmico de Engenharia Florestal da UFSM - Frederico Westphalen, e morador de Derrubadas, Ricardo Bauer Pilla, foi finalista na Olimpíada Brasileira de Língua Portuguesa em 2012, quando escreveu um artigo de opinião intitulado “Hidroelétricas: necessidade ou ganância?”. 
 
Na redação da Olimpíada, era necessário escolher um tema polêmico do local onde cada estudante vivia. Ricardo destaca que a escolha não poderia ter sido mais acertada, pois as consequências irreparáveis são inúmeras, como “do provável desaparecimento do maior Salto longitudinal do mundo e de um grande desequilíbrio não só ambiental como também sociocultural”. Ainda segundo o estudante, o governo e a comunidade deveriam dar mais atenção e valor a esse debate. 
 
Como futuro Engenheiro Florestal, Ricardo sabe das perdas que a construção das barragens no rio Uruguai podem causar na preservação dessa parcela da natureza refugiada, e que deveria servir como proteção à esses animais e plantas, e que muitas delas correm o risco de serem extintas. Por isso, ele considera importante que a comunidade que poderá ser atingida, deve se manifestar e lutar pelos direitos, não deixando a situação sair fora do controle. “O povo deveria se organizar e tomar frente, arregaçar as mangas e lutar por seus (nossos) direitos, mas quando abordado tais assuntos as discussões são fracas, o que mostra grande desconhecimento da real situação”, destaca Ricardo.
 
Podemos perceber que as discussões em torno deste tema levantam muitos questionamentos e posicionamentos. Devemos analisar o todo para visualizar o que é mais importante para nossa qualidade de vida. Se é investir em energia desta forma ou preservar um refúgio da natureza importante para o equilíbrio natural e fundamental para nossa própria sobrevivência. Com os estudos, é possível perceber o quanto rica e importante é a fauna e flora da região do Parque Estadual do Turvo, porém isso está ameaçado. Ainda que as empresas que realizam os estudos para a viabilidade da construção afirmem que não há ameaças ao Parque e ao Salto, vimos que o discurso foi diferente do resultado nas outras usinas construídas, e ainda, que estas, já prejudicam a visibilidade do Salto do Yucumã. Os turistas reclamam que viajam para ver essa maravilha da natureza e que quando chegam, se deparam com tudo alagado.
 
 
Andreia Primaz Eckhard é acadêmica de Jornalismo da Universidade Federal de Santa Maria, campus Frederico Westphalen. Este texto teve a orientação da Professora Cláudia H. de Moraes. Edição de Eliege M. Fante, especial para a EcoAgência. 
 
  
             
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