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Segunda-feira, 05 de Janeiro de 2009
  
SOS Ambiente Natural de Porto Alegre - Um desafio ao novo Secretário Municipal de Meio Ambiente, à Prefeitura e aos Porto-alegrenses

Ainda predomina nos governos uma visão imediatista de, simplesmente, licenciar obras e projetar a expansão ilimitada da cidade.

  
Por Paulo Brack
  
 

Porto Alegre apresenta uma grande riqueza de vegetação, paisagem natural e biodiversidade. Isto se deve a uma conjugação de fatores ecológicos decorrentes do contato entre três regiões geomorfológicas: Planície Costeira, Depressão Central e Escudo Cristalino Sul-Riograndense. Tal riqueza está descrita, de forma bem detalhada, no Atlas Ambiental de Porto Alegre (Menegat et al. 1998) e no Diagnóstico Ambiental de Porto Alegre (Hasenack et al. 2008), entre outros trabalhos. Em nosso município se encontram os biomas Mata Atlântica e Pampa. Inclusive temos espécies que provêm da Amazônia, no caso de uma árvore majestosa, a grápia, que atinge mais de 40 metros de altura.

No início da atual década, as áreas naturais e rurais ocupavam aproximadamente 1/3 da superfície de Porto Alegre. Temos mais de 40 morros e uma orla de algumas dezenas de quilômetros. Nossos arroios nascem límpidos na vegetação natural dos morros. A diversidade de tipos de vegetação é alta: matas de encostas, matas ciliares, matas de restinga, campos rupestres, campos de várzea, banhados, sarandizais, butiazais, entre outros, em morros e planícies, cada vez mais ameaçados, abrigando paisagens únicas e serviços ambientais fundamentais ao equilíbrio ecológico e à qualidade ambiental da cidade.

No município, ocorrem cerca de 1.280 espécies de plantas, segundo Balduino Rambo (1954), centenas de animais vertebrados, pelo menos três centenas de espécies de aves, dezenas de mamíferos, alguns raros, com destaque ao bugio, ao mão-pelada, ao ouriço-caixeiro, ao gato-do-mato, à lontra, entre muitos outros. Parte desta fauna e flora é composta por espécies  ameaçadas, porém, praticamente, sem a necessária existência de programas de conservação.

As diretrizes de conservação do ambiente natural quase nunca são montadas de forma eficiente, pois ainda predomina nos governos uma visão imediatista de, simplesmente, licenciar obras e projetar a expansão ilimitada da cidade. Geralmente, o poder central da prefeitura não dá a devida prioridade à área ambiental, porque é subserviente ou porque tem medo de se contrapor aos velhos interesses imediatistas dos que não pensam em sustentabilidade. Além disso, as áreas naturais não trazem para os cofres da prefeitura muitos impostos, não sendo ainda contabilizado o valor dos serviços ambientais da Natureza.

A Coordenação do Ambiente Natural (CAN) da SMAM desde sua criação - na década de 80 - vive de uma inanição crônica pela falta de prioridade à área e porque afetaria essa visão atrasada, reinante em outras secretarias mais graúdas e na política como um todo. O desenvolvimento “carro-chefe” continua sendo o investimento em crescimento urbano e construção de obras. Estas, sim, dão votos...

Assim, sucumbem as últimas áreas rurais e naturais da zona sul, onde a especulação imobiliária espera o momento da infra-estrutura chegar para a implantação dos seus grandes loteamentos. As avenidas e ruas acabam sendo projetadas para dar capilaridade a este crescimento desordenado. A orla do Guaíba, que ainda mantém uma beleza cênica ímpar e ecossistemas fundamentais aos peixes e outros organismos que aqui migram para desovar, desde a Lagoa dos Patos, está cada vez mais privatizada e ameaçada por este processo.

A SMAM teve pioneirismos. Foi a primeira secretaria municipal de meio ambiente no Brasil. Teve também a primeira reserva biológica municipal, no País: a Reserva Biológica do Lami. Possui outras áreas protegidas importantíssimas como o Parque Saint-Hilaire e o Parque Morro do Osso. Entretanto, o orçamento das Unidades de Conservação (UCs) não contempla estudos sobre a biodiversidade rara e ameaçada e não dispõe de projetos locais consequentes na área de Educação Ambiental. A SMAM tem um corpo técnico altamente capacitado que deve ser valorizado. Na área técnica, os CCs - que ainda são muitos em várias secretarias - deveriam ser substituídos por concursados para dar maior qualidade ao trabalho, evitando-se as tradicionais pressões políticas no licenciemnto, incompatíveis com a sustentabilidade ambiental.

Há mais de 30 anos acompanhando este processo, fica difícil de se acreditar que a falta de iniciativa e imobilismo da PMPA não seja um resultado de seu medo em enfrentar os grandes interesses do setor imobiliário. A SMAM não pode mais continuar isolada, dando prioridade, simplesmente, ao licenciamento e na gestão de parques, jardins e arborização. O caminho continua muito livre para os especuladores, e os licenciamentos, recorrentemente, são vistos “caso a caso”, pois enxergar o todo incomoda. A Secretaria deve trabalhar de forma conjunta, com as demais secretarias, de maneira transversal, holística, garantindo as leis que protegem à Natureza, em especial o Código Florestal, a Lei da Mata Atlântica e o conjunto de Políticas Ambientais. A SMAM deve definir, urgentemente, para cada área natural, um planejamento conservacionista duradouro, antes de os empreendimentos virem a bater a porta da Secretaria.

Deve-se terminar com a liberação de gigantescos condomínios, como os do Loteamento Agronomia e o do Terra Ville, em Belém Novo, pois são, pela sua própria escala, incompatíveis com uma cidade que quer manter paisagem, biota e qualidade ambiental. Não é possível que não sejam estabelecidos limites máximos ao tamanho dos empreendimentos imobiliários. Algo que possa - dependendo do caso - chegar a um máximo de 5 hectares, mas não os 260 hectares recentemente aprovados. Para começar, uma moratória aos gigantes!

Com a velocidade de conversão de áreas naturais em áreas urbanas, nos últimos anos, estamos atingindo o patamar assustador de perda de um mil hectares a cada dois anos! Em duas décadas, poderemos nos tornar uma cidade como Canoas. Neste município, restam menos de 10 % da área natural, e, ainda por cima, devorados, diariamente. Neste ritmo, nossa cidade estará condenada à especulação dos que só vêem desenvolvimento com a expansão horizontal e vertical do espaço construído.

A zona rural de Porto Alegre também é importante, devendo ser resgatada, pois desempenha papel ecológico importantíssimo e disponibiliza alimentos mais baratos, inclusive orgânicos, e também desenvolve o turismo. Da mesma forma, o turismo, em áreas de morros e orla, pode estar associado a esta atividade, incorporando trabalho, renda e cidadania às comunidades carentes, com saneamento e vida digna. Entre as áreas naturais e rurais, deve se pensar em manter os corredores ecológicos, que foram deixados de lado, por falta de vontade e de metas de conservação. Estes devem ser mapeados e decretados, com urgência, antes que seja tarde. É necessário maior controle das ocupações irregulares, com acesso à moradia aos que necessitam, em áreas onde o impacto seja menor. Também, não deve ser deixada de lado a fiscalização de áreas de risco e naturais, por falta de veículos e/ou de pessoal.

Nosso município é ainda muito belo e não merece se tornar refém das visões ultrapassadas que teimam em criar eutanásias para nossas áreas naturais. A Prefeitura Municipal deve encarar com maior seriedade este assunto, governando de forma transversal e democrática, pensando no futuro da biodiversidade e na qualidade de vida dos seus cidadãos. A Sociedade Porto-alegrense deve acompanhar mais estes temas e cobrar a sua própria participação nestas decisões para que o Governo Municipal e ela (a população) assumam o compromisso em resguardar a integridade dos ecossistemas e da vida natural que ainda resta no município para as próximas gerações. 

Paulo Brack é ex- técnico da Secretaria Municipal de Meio Ambiente, professor do Instituto de Biociências da UFRGS e membro do Ingá- Instituto Gaúcho de Estudos Ambientais.

  
             
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