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Sexta-feira, 23 de Outubro de 2009
  
Um novo modelo de desenvolvimento rural

Os números do Censo Agropecuário do IBGE mostram que está em curso uma mudança no campo brasileiro e que não estamos condenados a um único modelo de produção.

  
Por Guilherme Cassel
  

O Censo Agropecuário 2006, realizado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), jogou luz sobre o campo brasileiro mostrando qual é o setor mais produtivo, que gera mais empregos e que coloca alimentos mais saudáveis na mesa da população brasileira. Esse setor é o da agricultura familiar.

Apesar de ocupar apenas um quarto da área cultivada, a agricultura familiar responde por 38% do valor da produção  (ou R$ 54,4 bilhões). Mesmo cultivando uma área menor, a agricultura familiar é responsável por garantir a segurança alimentar do País, gerando os principais produtos da cesta básica consumida pelos brasileiros. A agricultura familiar emprega quase 75% da mão de obra no campo e é responsável pela segurança alimentar dos brasileiros, produzindo 70% do feijão, 87% da mandioca, 58% do leite e 46% do milho, entre produtos consumidos pela população. O Censo mostra ainda que existem 4.367.902 estabelecimentos de agricultura familiar no Brasil, que representam 84,4% do total, (5.175.489), mas ocupam apenas 24,3% (80,25 milhões de hectares) da área dos estabelecimentos agropecuários brasileiros.

No período entre 1985 e 1995, o número de estabelecimentos até 10 hectares caiu significativamente e a área cultivada por eles também. Já de 1995 a 2006, a área da agricultura familiar continuou praticamente a mesma, mas o número de estabelecimentos aumentou, o que indica que esse processo não se deu à custa da migração do campo para a cidade, como ocorria no passado.

Esses números mostram que está em curso uma mudança no campo brasileiro e que não estamos condenados a um único modelo de produção. Desde os anos 70, as políticas públicas voltadas para a agricultura obedeceram a uma concepção específica de modernização tecnológica. Através dela, procurou-se aumentar a produtividade da força do trabalho empregada no cultivo e na criação de animais mediante o uso de tecnologias que substituíram trabalho humano pelo emprego intensivo de máquinas e insumos químicos. De modo geral, essa concepção favoreceu o monocultivo em grandes extensões de terra, em sua maioria em poder de estabelecimentos de grande porte.

A combinação de uma estrutura agrária concentrada, políticas agrícolas e padrão tecnológico excludentes produziu o empobrecimento de milhares de famílias de pequenos e médios agricultores, processo que, em muitos casos, resultou na perda de suas propriedades, perda de biodiversidade e contaminação de rios, alimentos e pessoas pelo uso intensivo de agrotóxicos. O movimento dominante neste período foi a progressiva expulsão de homens e mulheres do campo, que foram engrossar os bolsões de pobreza nas periferias urbanas.

Nos últimos anos, no entanto, um conjunto de políticas públicas voltadas ao fortalecimento da Reforma Agrária e da Agricultura Familiar começou a alterar significativamente esse cenário de empobrecimento do meio rural. O Censo Agropecuário mostra que está em curso uma nova dinâmica social e produtiva no campo brasileiro. Uma dinâmica onde pequenos e médios produtores viraram sinônimo de qualidade de vida.

É importante destacar que esses resultados são fruto de uma longa jornada de lutas sociais e de reconhecimento pelo Estado brasileiro da importância econômica e social e da legitimidade das demandas da agricultura familiar, um conjunto plural formado pela pequena e média propriedade, assentamentos de reforma agrária e as comunidades rurais tradicionais – extrativistas, pescadores, ribeirinhos, quilombolas. Essa jornada foi impulsionada por lutas sociais que integraram a agenda da redemocratização brasileira e que aos poucos foram inscrevendo no marco institucional as novas políticas públicas de desenvolvimento rural.

Há uma agenda pós-crise colocada neste início do século XXI. Estamos assistindo a uma confluência de crises econômica, energética e ambiental e o fracasso de um modelo baseado nas teorias do Estado mínimo e da desregulamentação desenfreada. Esse cenário coloca a questão ambiental e a segurança alimentar dos povos na ordem do dia. A vitalidade da agricultura familiar brasileira mostra que outro modelo de desenvolvimento rural é possível. Mais do que isso, é necessário. A realidade apontada pelo Censo refuta aqueles que insistem em dizer que o único traço de modernidade no setor rural é aquele expresso pelas grandes plantações mecanizadas voltadas para a exportação. Ela mostra uma alternativa concreta que combina crescimento econômico, luta contra a fome, a pobreza e a desigualdade social, produção de alimentos saudáveis, geração de conhecimento, proteção ao meio ambiente e a incorporação de milhões de brasileiros e brasileiras ao universo dos direitos, que é o universo da cidadania.

Guilherme Cassel é engenheiro civil e ministro de Estado do Desenvolvimento Agrário.

  
             
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